sexta-feira, 9 de outubro de 2015

Faz-me falta a tua prosa, e não percebeste ainda. Ou não queres perceber. Foi giro como nos "conhecemos", não sei nada de ti nem tu de mim, e no entanto houve alturas em que nos entendemos tão bem. E apenas por palavras, que é a meu ver a forma mais difícil de duas pessoas se entenderem. O que não dizias, tentava adivinhar, fazia "o filme" para logo a seguir deitares o cenário todo ao chão. Era bom, era um desafio constante, uma amizade que crescia (pensava eu...). Tudo tem a sua razão de ser. E por isso mesmo, como apareceste, desapareceste. Fico sem nada saber tal como não sabia. Dá me vontade de rir tudo isto e só por isso já valeu apena. Promessas, valem o que valem: nada. 
Há coisas na vida que precisamos de passar  por elas, transpô-las, atravessar mesmo. Depois é sacudir e seguir em frente sem olhar para trás. As vivências, as recordações, ficam connosco e o caminho faz-se de cara levantada para que os olhos consigam abarcar o chão e o horizonte, sem limitações.  Tudo vem na hora certa, às vezes não percebemos é porquê. Mas quando nos afastamos de nós mesmos e dos outros, vimos tudo mais claro porque noutra dimensão, e aí as peças do puzzle começam a encaixar. E tenho alturas que os meus pés mal tocam o chão porque o sonho me invade a alma. Está a vir à minha memória um poema que declamei parte dele em criança (essa criança que nunca quero perder)...


Pedra Filosofal

Eles não sabem que o sonho

é uma constante da vida

tão concreta e definida

como outra coisa qualquer,

como esta pedra cinzenta

em que me sento e descanso,

como este ribeiro manso

em serenos sobressaltos,

como estes pinheiros altos

que em verde e oiro se agitam,

como estas aves que gritam

em bebedeiras de azul.



eles não sabem que o sonho

é vinho, é espuma, é fermento,

bichinho álacre e sedento,

de focinho pontiagudo,

que fossa através de tudo

num perpétuo movimento.



Eles não sabem que o sonho

é tela, é cor, é pincel,

base, fuste, capitel,

arco em ogiva, vitral,

pináculo de catedral,

contraponto, sinfonia,

máscara grega, magia,

que é retorta de alquimista,

mapa do mundo distante,

rosa-dos-ventos, Infante,

caravela quinhentista,

que é cabo da Boa Esperança,

ouro, canela, marfim,

florete de espadachim,

bastidor, passo de dança,

Colombina e Arlequim,

passarola voadora,

pára-raios, locomotiva,

barco de proa festiva,

alto-forno, geradora,

cisão do átomo, radar,

ultra-som, televisão,

desembarque em foguetão

na superfície lunar.



Eles não sabem, nem sonham,

que o sonho comanda a vida,

que sempre que um homem sonha

o mundo pula e avança

como bola colorida

entre as mãos de uma criança.




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